quarta-feira, 2 de junho de 2010

Em meu aniversário...

Pus-me a pensar desde a tarde de ontem no que eu gostaria de publicar neste meu espaço no dia em que completo mais um ano vivido. E somente agora tornou-se claro. Gostaria de escrever sobre um filme do Clint Eastwood. Gosto muito dos filmes dele, mas um em especial marcou profundamente minha “maneira de colocar-me perante o mundo” (e estou falando de Filosofia). Trata-se de “Menina de Ouro” (no original, Million Dollar Baby), um filme magistral que trata de temas inerentes à vida humana (luta, família, redenção, perdão, escolha, distância), utilizando como metáfora (da vida) o boxe e que se constrói sobre o paradoxo – trabalho perfeitamente no esquema próprio da existência humana.
Entretanto, poderia surgir a questão: “Por que falar de um filme no dia do próprio aniversário?”. Peço a você, meu leitor, que exercite um pouco de sua paciência e caminhe comigo ao longo do que vai escrito na sequência.
Voltando no tempo, vinte e seis anos atrás, na noite de um sábado, eu vinha ao mundo. Havia começado a ser fabricado nove meses antes, numa tarde, sob o calor de Salvador, em dia de Parada Nacional (07 de setembro). E minha mãe sempre faz questão de ressaltar: “você é resultado de um momento de profundo amor”. Sou filho do amor...
E, ao introduzir minha mãe neste texto, aproximo-me do “acontecimento” do filme em questão na minha vida. Mas, antes, vale recordar quem é minha mãe para mim. Tudo começa com o meu aniversário de oito anos: ganhei de presente, em meu aniversário, a separação dos meus pais.
O que vi depois disso começou a construir verdadeiramente quem sou.
Minha mãe ficou profundamente abatida com todo aquele revés. Todavia, em vez de desanimar conseguiu se fortalecer (e não me perguntem a partir de qual motivação, pois eu não saberia responder) e lutou bravamente. Não foram poucas as derrotas que ela amargou nesse período: desemprego, fome, desespero etc.
É também desse período a lembrança mais amarga que carrego comigo. Num certo dia, tendo ido almoçar na casa dos meus bisavós, fui profundamente humilhado: ao pegar um pedaço de carne fui destratado por minha bisavó que, num gesto de avareza, disse que faltaria carne para um tio que ainda iria chegar. Imediatamente empurrei o prato à minha frente como que desprezando-lhe, ao que minha mãe sussurou em meu ouvido: “filho, você vai terminar seu prato porque em casa não há nada para comer”. E devo confessar: foi a comida mais amarga da minha vida. E foi nesse dia, aos nove anos de idade, que prometi a mim mesmo que eu daria certo nesta vida.
Um ano após esse episódio, minha mãe e eu fomos morar no interior. E então as coisas ficaram melhores e piores. Melhorou nossa condição de vida; piorou o relacionamento, pois eu estava entrando na adolescência. E as opções que eu tomei nesse período de minha vida foram as mais irracionais possíveis... Apesar de tudo o que vivi, do excesso de preocupações que causei, o amor de minha mãe mostrou-se sempre acima de tudo, numa palavra: incondicional. Infelizmente essa descoberta ocorreu há pouco tempo. Mas penso que foi necessário um longo processo de amadurecimento e auto-aceitação de minha parte para aceitar esse amor gratuito que minha mãe sempre dispensou a mim.
Mas, o que tem o filme do Clint a ver com tudo isso? Afinal, comecei o presente texto anunciando que se trataria de um comentário ao filme dele. Na verdade, tudo não passou de um pretexto. Queria mesmo falar de mim e do quanto o filme influenciou em minha construção. Por isso foi necessário falar tão demoradamente de minha mãe: ela é o meu alicerce. O homem que sou é reflexo do amor que ela depositou em mim... E o filme do Clint me ajudou a descobrir isso numa de suas cenas, quando o protagonista entrega um agasalho para a lutadora que ele treinara com as palavras “Mo Chuisle”, oriundas do gaélico, idioma utilizado pelos antigos povos celtas. E o significado só será revelado próximo ao desfecho do filme: Mo Chuisle significa “sangue do meu sangue”, “meu pulso”, podendo ser entendido como uma palavra de carinho (algo como “querido/a”). Pode até parecer absurdo, mas foi nesse exato momento que compreendi o papel fundamental da minha mãe em minha vida: descobri o orgulho de ser fruto dela, de ser sangue do sangue dela, de me reconhecer portador da força que a moveu a dar a volta para cima... Enfim, reconheci-me na minha mãe e em seu incondicional amor por mim.
Hoje, no dia do meu aniversário, quero comemorar a vida da minha mãe. Afinal, sei que sou a melhor parte do que ela é...

12 comentários:

  1. Braulio de Melo Araujo2 de junho de 2010 às 14:32

    Aos 20 anos de idade vi, pela primeira vez, uma mulher dar a luz a uma criança. Estava no terceiro ano de faculdade e já chegara a hora de conhecer alguns dos maiores segredos da vida.
    Fiquei chocado com todo o contexto de sofrimento e dor do labor.
    Ela era uma menina de 20 e alguns anos, negra, linda e nervosa com sua primeira experiência de maternidade. Não tardo em dizer que nunca vi tanto sofrimento, suor, gritos e desespero até que finalmente a criança nasceu e como que magicamente tudo passou: o bebê estava bem e uma profunda paz reinou na sala de parto. Nesse momento algo estranho começou a acontecer comigo, fui invadido de uma profunda ternura e amor e fiquei a contemplar aqueles dois.
    No fim do parto ocorre a dequitação, momento em que a placenta desprende-se do útero.
    Quando aquela placenta se desprende do útero provoca uma hemorragia profusa, que banha de sangue a mulher e os arredores. Isso tudo é fisiológico, natural e como não podia deixar de ser para mim, um momento de profunda poesia.
    Naquele momento entendi o que é ser carne de uma carne e sangue de um sangue. Naquele momento entendi, dentro de minha limitação de homem, o que é ser mulher e mãe.
    Saí de fininho, escondi-me atrás de um armário e chorei como criança.

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  2. Com certeza Rosana merece letra a letra tudo que foi dito sobre ela. Parabéns pelo homem que você forjou. Ele é feito da matéria com que se esculpe os nobres. Aliás, parabéns aos dois. Beijo grande.

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  3. Fala amigo!
    Gostei muito do seu blog!
    Fique na paz feliz aniversário e você sabe que estou aqui.

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  4. Mais uma vez, parabéns pelo seu aniversário e pela linda homenagem à sua "mamma". Felicidades!
    beijos

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  5. Parabéns, meu Filho, pelo seu aniversário, mas principalmente pelo homem em que está se transformando a cada ano que a vida te dá. Parabéns pela sabedoria de extrair sempre o melhor da vida, das pessoas, e de si próprio.
    Parabéns por saber transformar este extrato que a vida oferece, em néctar, em perfume, em amor, e dividir isto, com quem não atingiu tal estágio de evolução.
    Saiba que te amo muito, e que tenho muito orgulho de poder ser chamado de Pai, por uma pessoa da tua magnitude.
    Concordo com cada palavra do teu texto, quando ele se refere à tua Mãe e acho que não existe melhor presente para quem está festejando mais um ano de vida, do que poder se referir desta forma a pessoa que lhe proporcionou a oportunidade de iniciar esta vida.
    Mais uma vez parabéns! E seja muito feliz, porque, tenha toda a certeza, você merece!!!
    Do Teu Pai.

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  6. É necessário coragem para se expor desta maneira, sinto-me lisonjeada por você compartilhar comigo este espaço. Estarei torcendo para que todos os seus projetos se realizem. Deus te abençõe! Deixo a letra da música que fortalece os meus dias:
    O Que É, O Que É?
    Gonzaguinha
    Composição: Gonzaguinha
    Eu fico
    Com a pureza
    Da resposta das crianças
    É a vida, é bonita
    E é bonita...

    Viver!
    E não ter a vergonha
    De ser feliz
    Cantar e cantar e cantar
    A beleza de ser
    Um eterno aprendiz...

    Ah meu Deus!
    Eu sei, eu sei
    Que a vida devia ser
    Bem melhor e será
    Mas isso não impede
    Que eu repita
    É bonita, é bonita
    E é bonita...

    E a vida!
    E a vida o que é?
    Diga lá, meu irmão
    Ela é a batida
    De um coração
    Ela é uma doce ilusão
    Hê! Hô!...

    E a vida
    Ela é maravilha
    Ou é sofrimento?
    Ela é alegria
    Ou lamento?
    O que é? O que é?
    Meu irmão...

    Há quem fale
    Que a vida da gente
    É um nada no mundo
    É uma gota, é um tempo
    Que nem dá um segundo...

    Há quem fale
    Que é um divino
    Mistério profundo
    É o sopro do criador
    Numa atitude repleta de amor...

    Você diz que é luxo e prazer
    Ele diz que a vida é viver
    Ela diz que melhor é morrer
    Pois amada não é
    E o verbo é sofrer...

    Eu só sei que confio na moça
    E na moça eu ponho a força da fé
    Somos nós que fazemos a vida
    Como der, ou puder, ou quiser...

    Sempre desejada
    Por mais que esteja errada
    Ninguém quer a morte
    Só saúde e sorte...

    E a pergunta roda
    E a cabeça agita
    Eu fico com a pureza
    Da resposta das crianças
    É a vida, é bonita
    E é bonita...

    AXÉ!
    MÁRCIA XAVIER

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  7. "Mo Chuisle"... eu te amo, compartilho muitos dos degraus dessa escada da sua vida... E só posso repetir: eu te amo...

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  8. O que dizer desse Menino-Homem?....Mãe é suspeita de elogiar, fica muito óbvio! Amor de mãe não precisa ser explicado, sempre é incondicional, bem pelo menos o meu é!!!! Chorei muito quando relembrou nossos momentos mais difíceis.Ufa, hoje olho para trás e penso como conseguimos superar esse terremoto em nossas vidas????????? Sei de uma força interior, que dizia que apesar do que as pessoas achavam, negativamente, nós seríamos um sucesso. Eu não estava errada! E para que você não esqueça nunca: eu tenho muito orgulho de você e de ser sua mãe e que meu amor é incondicional!!! Sua mãe Rosana Oliveira de MOraes

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  9. Preciso de dizer que estou aqui aos prantos??? Não, nhe?? Vc me conhece o suficiente pra saber q iria me causar isso!!

    Que coisa linda, amigo!! Mais lindo ainda é olhar pra trás pelo retrovisor da vida e ver quanta coisa eu vi e vive com vc em relação a mudanças e ao mesmo tempo perceber q diante d tudoo eu num vi quase nada... Se eu acho q participei d muito... A verdade é q participei d muito pouco... E isso é lindo!! Pq é prova viva d q nós temos dentro d nós uma força q nos leva ao crescimento e q pra ela ser potencializada a gnt precisa de relaçoes q facilitem. E sua mãe a estabeleceu com vc d modo brilhante, neh??
    E num podia deixar de ser!! É tanto amor q emana da tia Ro, tanta força, tanta garra e ao mesmo tanta simplicidade...
    ... que no fim de tudo eu só posso agradecer a Deus e ao Darwin (rs) por me permitirem conhecer, amar e estar numa pequena parte dessa linda história!
    Amo vc! Isso é fato!!
    Obrigada por ser o q e qm é?
    Abraço bem apertado d urso!! rs
    Com carinho incondicional,
    Bia

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  10. PS: Eu num podia deixar d falar de Rogers, neh??? heheheh Afinal, eu consegui t tirar dos comportamentais e te trazer pro humanismo!! Espero! hauahuahuahauh

    Amoooooooo!!!

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  11. Fala serio, ler essa declaração com uma válvula falhando é duro, mas o choro permite lembrar-me como te amo meu menino...Afinal Deus não permitiu ser mãe de um menino, mas continuo a ser madrinha mil beijos sua tia LU.

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  12. Uma das grandes bênçãos da vida é a experiência que os anos vividos nos concedem. E não apenas o numero de anos, mas e principalmente, a intensidade com a qual vivemos nossas experiências e o quanto nos permitimos aprender com as mesmas.
    Essa sua reflexão mostra o quanto foi valioso esse seu aniversário, pois foi capaz de aprender crescer e se tornar uma pessoa maravilhosa a partir de suas experiências, e foi ainda inteligente o bastante de reconhecer que o que você é, é fruto direto dessas.
    Desejo-te todo sucesso, toda paz e toda a felicidade do mundo. Que você possa se conservar essa pessoa especial, inteligente e reflexiva que é!

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